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Artigo publicado no The Washington Post - 12/10/1998
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ROANOKE - O escritório da diretora
da Escola de 1º Grau Fallon Park, localizada em um bairro pobre desta
cidade de cem mil habitantes, nas montanhas da Virginia, costumava ser
um local tenso e agitado. Nunca menos de quatro pequenos "aprontadores"
estavam reunidos lá dentro, enquanto outros tantos faziam fila do
lado de fora, esperando sua vez de escutarem censuras a seu comportamento
inadequado.
Mas este ano os estudantes que se aglomeram naquela sala mais parecem ter sido reunidos para serem elogiados por seu bom comportamento. É uma mudança dramática de conduta que a diretora Rita Dunkin atribui a um novo programa que objetiva introduzir o ensino da ética no currículo. Desde que as lições foram iniciadas, há oito meses, as suspensões cairam em mais de 60%, a frequência aumentou e as notas subiram. O programa a que se atribui tal transformação é chamado Character Counts! (O Caráter Conta!). Desenvolvido pelo Joseph and Edna Josephson Institute of Ethics, organização sediada na Califórnia, o programa promove o comportamento ético ao enfatizar os seis "pilares do caráter": sinceridade, respeito, responsabilidade, senso de justiça, zelo e cidadania, e tenta fazê-lo sem envolver as escolas da rede pública na discussão sobre ensinar valores que possam ofender algumas famílias. A experiência da Escola Fallon Park motivou o senador estadual John S. Edwards (Democrata, representando Roanoke) a propor uma legislação que exigira que toda escola de 1º grau na Virginia adotem alguma forma de educação do caráter. O secretário estadual de Educação, Wilbert Bryant, respondeu à proposta de Edwards declarando que apesar de ele e o governador James S. Gilmore III apoiarem a idéia da educação ética, eles se opõem à lei porque acreditam que cada escola nos distritos devem ter autonomia para desenvolver suas próprias políticas. Alguns dirigentes de escolas locais também vêem a proposta como uma ameaça à sua autoridade. "Sou um grande defensor da educação do caráter, mas penso que cada escola deve desenvolver e implementar seu próprio programa, baseado nas necessidades específicas de sua comunidade", diz o vice-presidente do conselho escolar do condado de Fairfax, Mark H. Emery, acrescentando que cerca de 60% das escolas de Fairfax já têm programas nesse sentido. "Eu também me oporia por se tratar de uma intervenção estadual em nosso condado. Já temos muita intervenção demais por aqui." Alguns grupos conservadores, como a Family Foundation, também se opõem à proposta de Edwards, por não gostarem da idéia de o estado determinar às escolas locais o que ensinar em áreas não acadêmicas. Do mesmo modo como fomos contrário à educação obrigatória de vida familiar, nos opomos à essa abordagem tipo "modelo único", disse a representante da Family Foundation, Robin DeJarnette. Ela apontou que a lei estadual iria se sobrepor a programas já em andamento, como um desenvolvido no condado de Chesterfield, "onde os pais e a equipe da escola trabalharam um bocado para definir que programa eles queriam." Se alguma versão da proposta de Edwards passar, a Virginia se tornará o primeiro estado a adotar exigências na área de educação do caráter. O programa Character Counts! também está sendo testado no Ginásio Broad Run, no condado de Loudoun, e a escola está verificando resultados csemelhantes aos de Fallon Park, conforme declarações da equipe local. A frequência aumentou, e o número de estudantes suspensos diminuiu", disse o professor de história Roy Hall. "Embora seja difícil comprovar a influência do programa, pelo menos foi uma feliz coincidência", acrescentou Hall, co-diretor do programa na escola para 1.600 estudantes em Ashburn. O conselho diretor do programa Character Counts! tem integrantes conservadores e liberais, incluindo o ator Tom Selleck, o cantor Lee Greenwood, a dirigente do Children's Defense Fund, Maria Wright Edelman e líderes educadores e religiosos. A idéia de trazer o Character Counts! para Fallon Park veio de Rita D. Bishop, superintendente-assistente escolar, que descobriu o programa quando seu filho participou de um treinamento na US Naval Academy, que havia adotado o programa para resolver falhas éticas que haviam provocado escândalo. Uma segunda escola em Roanoke planeja experimentar o Character Counts! em breve; o programacusta apenas US$500 para ser iniciado - a quantia necessária para treinar professores. O dia escolar em Fallon Park começa com os estudantes recitando o Juramento da Lealdade, edepois um outro compromisso escrito pelos alunos e seus professores. A cada dia, em nossas palavras e ações, eles dizem, nos esforçaremos para demonstrar respeito, zelo, justiça, sinceridade, responsabilidade e cidadania. Essas qualidades nos ajudarão a ser estudantes bem sucedidos, que sabem trabalhar e se divertir juntos. Até as crianças de cinco anos do jardim-de-infância Heather Plunkett conhecem os "character pillars", ou "caterpillars" (largatas) - como elas chamam os valores éticos. Esses seis pilares não são ensinados como um curso separado mas sim são incorporados em todas as matérias curriculares e podem ser vistos nos painéis nas paredes e decorando colunas, que foram pintadas no esquema de cores que codificam cada um dos seis valores - vermelho para zelo, por exemplo. Katlen Manning, 7 anos, aluna do segundo ano do 1º grau, as unhas pintadas de vermelho, prometeu, em uma história que está escrevendo, "ser gentil mesmo com quem me trate mal". Sua amiga Becky Mayo, de pé sobre seus sapatos de salto alto recém comprados no Kmart, assinou uma resolução de Ano Novo prometendo "ser uma boa cidadã em 1999." Numa aula para o quinto ano, um estudo sobre as células provocou a observação de um aluno de que é "responsabilidade"do núcleo garantir que a célula está viva. E durante uma aula de leitura, uma criança disse a sua professora que, na história do Mágico de Oz, era responsabilidade de Dorothy seguir pela Estrada do Tijolo Amarelo e respeitar sua família. A educação do caráter não se limita ao espaço da escola. Freida Himes, assistente da direção, disse que a caixa fixada do lado de fora de sua sala, onde os motoristas dos ônibus escolares colocam os nomes dos alunos que criam problema durante as viagens, hoje fica vazia a maior parte do tempo, e que é cada vez mais raro ser chamada a um dos veículos escolares para restaurar a ordem. Nick Patterson, 8 anos, disse que está tentando observar os valores também em casa. "Eu chamei meu irmão Josh, de 14 anos, de idiota", contou. "Eu estava muito irritado com ele, mas provavelmente feri seus sentimentos. Eu realmente nem liguei para isso, e não tive zelo bastante." Nick também disse que, depois de ter dito a uma coleguinha que seu vestido era feio, voltou a ela e disse que sentia ter dito algo que nem era verdade só porque estava zangado. Hoje há menos violência e intimidações entre as crianças, confirmou o conselheiro pedagógico Richar Nininger, encarregado das questões disciplinares da escola. Nininger disse que neste último ano letivo teve 10 ou 12 incidentes que levaram a suspensões de alunos, comparados com os mais de 30 do ano anterior. "O grupo hoje é mais gentil, mais sensível. Eles estão mais cuidadosos uns com os outros." A professora de educação física Cheryl Nicely, veterana de 20 anos em Fallon Park, disse que notou uma significativa mudança no comportamento dos jovens durante os jogos e as atividades muito dinâmicas realizadas no ginásio de esportes: era um fato corriqueiro, para uma criança que fosse acidentalmente derrubada durante uma brincadeira, levantar-se e empurrar de volta, gritar palavrão ou mesmo começar uma briga. "Mas agora", disse Nicely, "eles estão mais dispostos a pedir desculpas e a se ajudarem a se levantar novamente". E posso contar nos dedos de uma mão o número de palavrões que ouvi nos últimos tempos. O verdadeiro espírito esportivo tem prevalecido." Nicely lembrou um incidente recente no qual um menino - que costumava ser um problema e que no ano passado era frequentador assíduo do gabinete da diretora, chegou a sair de seu caminho ara vir ajudar uma menina tímida a participar de um jogo. "Eu quase chorei", disse Nicely, "aquele dia valeu pelo ano todo. Este foi o melhor ano que já vivi nesta escola." |