De fato, a partir do final da década de
1970 começou a ofensiva dos meios de comunicação para evitar que
a população percebesse que a
sociedade estava estava em um caminho insustentável, rumo ao desastre
socioambiental denunciado
crescentemente por
livros seminais e definitivos, como os seis exemplos
abaixo:
-
"Primavera Silenciosa" (Rachel Carson,
1962), sobre o envenenamento dos alimentos e da natureza pela agricultura
industrial;
-
"O Homem Unidimensional" (Herbert Marcuse, 1964), como
a sociedade CIU (capitalista-industrialista-urbanicista) nos condenava à
frustração, à violência e à destrução
da natureza.
-
"Sois todos Sanpaku" (George. Oshawa,
1968), denunciando
a alimentação industrializada como fator de decadência física, mental e
cultural;
-
"Limites do
Crescimento" (Clube de Roma, 1972) - o título já dizia
tudo;
-
"Small is beautiful" (E.F. Schumacher, 1973),
um estudo da economia como se as pessoas tivessem importância;
e
-
"A
Expropriação da Saúde"
(Ivan Illich, 1976), como a "indústria da saúde" precisa e prefere
nos manter doentes.
Assim,
no final dos 1970s, ficou claro para os grandes grupos
econômicos, então organizados na Trilateral, que era preciso
acabar com a contestação que inspirava a juventude desde o fim dos
anos 1950s, e incluíam fenômenos tão díspares quanto os
"existencialistas" europeus, a "juventude transviada" americana, os beatniks franceses, as
grandes manifestações em Paris, San Francisco, Rio etc.
O arco do inconformismo dos jovens com o
sistema dominante ia desde o
radicalismo dos grupos guerrilheiros formados por jovens das classes
mais favorecidas, como o Baader-Meinhof, os Tupamaros, o MIR e o
MR-8, passava pela oposição à guerra do Vietnã até chegar à outra
ponta, onde se misturavam psicodelia, meditação e expansão da
consciência, filosofias orientais e macrobiótica, agricultura natural, Reich e Rajneesh.
Era preciso dar um fim a
tudo isso, e logo!
Missão possível: frustrar a previsão
de Bob Dylan de que os tempos estavam grávidos de
mudança.
Primeiro era preciso cortar
a ligação
com o passado
cultural, intelectual e artístico da humanidade, e desprezar a
História e ridicularizar quem estudava. Era urgente idiotizar
as novas gerações com desenhos animados cada vez mais
simplórios e grotescos, com erotização precoce
e cada vez mais generalizada, com
imagens e música estressantes, visuais
e sons desorganizados à guisa de modernidade e alegria, e
um falso sentimento de liberdade pautado
pelas agências de publicidade.
Era
preciso valorizar o inútil, o deletério, o alienado, o vulgar. Celebrar a Luiza Brunet,
o Humberto Saade e a Monique Evans, o Chacrinha, o Washington Olivetto,
o Ricardo Amaral. Era preciso estimular o sensacionalismo para
soterrar a reflexão; promover a transgressão
inócua, gaiata e comercial dos Dzi Croquetes,
Frenéticas e Leopardos, a diversão paga em danceterias e
festas rave;
quanto mais purpurina melhor...
Nessa virada de década - 1970 /
80 - os segundos cadernos dos grandes jornais passaram por uma
mudança fatal, e baniram os artigos críticos, a crítica literária
e cultural, a poesia, as crônicas sensíveis, e substituíram
pela cobertura acrítica de megaeventos de música brega,
como o Rock in Rio, ou de moda idem, cono o Rio
Fashion Week. E por matérias sobre "comportamento"
que banalizavam extravagâncias, consagravam idiotices
e depreciavam, ironizando, o que chamavam de
papos-cabeça.
A ordem era relativizar tudo - é tudo
igual - tudo tribos - e se havia os alternativos, os naturalistas, os
ambientalistas, os voluntários conscientes, preocupados e envolvidos, eles
valiam tanto - ou até menos - para
a mídia, quanto as tribos dos punks, dos
gays, dos drag-queens, do mundinho
fashion; dos clubbers,
dos góticos, das vadias. Era indispensável
lembrar aos novos jovens que o bom era ser yuppie
metrosexual, jamais um
hippie
desejando viver uma vida mais frugal
junto à natureza - antecipando, aprendendo e ensinando o que nossos
descendentes terão que viver.
Interessante notar que é dessa época o
ingresso nos meios de comunicação de jovens formados, ou
conformados, ou deformados nas escolas de comunicação
obrigatórias, onde eram sistematicamente doutrinados a achar tudo
normal , tudo
relativo. Tudo é legal,
e não cabe aos jornalistas chamar
a atenção para a loucura que está acontecendo. Por exemplo: para a
adulteração genética dos alimentos. Há décadas isso provocaria uma reação formidável;
hoje a população está anestesiada pela cultura de
massa e perdeu a capacidade de reagir e de
se organizar para exigir respeito.
Como isso acontecei? Bastou orientar a mídia
a apenas noticiar, mas jamais se indignar, ou criticar, nem achar
nada de nada, sem relacionar um fenômeno novo com uma rede de fatos
que o precederam e com os prováveis fatos que
o sucederão - se não fizermos algo para melhorar
essa cadeia de derivação dependente.
Como um jovem jornalista diplomado
em comunicação pode perceber todo o mal - toda a
deformação - que a publicidade provoca na sociedade, ao estimular o consumismo
e a leviandade, quando ele mesmo passou 4 anos em uma faculdade
onde há colegas seus estudando justamente para serem publicitários
- muitas vezes em universidades mantidas com verbas públicas - é o
público pagando para ser enganado.
Outra "norma de redação" que a mídia adotou nessa
época, para adiar ao máximo a expansão da consciência ecológica e a busca
da sustentabilidade - além de proscrever o Tom Jobim de suas
páginas e transmissões - foi passar a chamar os ambientalistas
e pioneiros alternativos de "ecochatos", "naturebas" e
"bichos-grilos", num raro exercício de indução ao preconceito, de "ecofobia"
ou "bullying" midiático, que não vemos os jornalistas adotarem com
nenhuma outra "tribo", por mais bizarra, inútil ou idiota que
seja.
Só não concordei com o Ruy no último
parágrafo, quando ele diz que "não percebíamos"...
Percebíamos sim, você inclusive, Ruy, mas não tinhamos força para levar a mídia
a criticar o modelo econômico que enriquecia os seus
anunciantes.
Agora, passada
a RIO+20, vamos ver se a mídia trata melhor os ambientalistas e
nos ajuda a despertar a sociedade da ilusão nefasta em que se perdeu,
há 30 e poucos anos
atrás.