Relato de André Pol sobre o que viu acontecer na região

André Pol é biólogo e consultor ambiental.
Sua família tem casa acima da margem itatiaiense
do Rio Marimbondo (mas fora da APP) há muitos anos.


Ausente da região nos últimos cinco anos
fui surpreendido no inicio desse ano pelo deslizamento na subida da serra, que resultou em sua interdição por 15 dias e, posterior liberação para o alívio dos hoteleiros e comerciantes incautos e ávidos pelo turismo. As autoridades aceitaram a solução técnica “porca” apresentada pelo executor e liberaram a circulação de veículos. Um enorme plástico preto gradativamente foi se deteriorando expondo aos olhos o enorme risco de acidentes, não havia qualquer estrutura de contenção que protegesse os passantes das rochas soltas e pendentes em encosta extremamente íngreme e instável.

Conforme as obras foram avançando outras graves revelações vieram ao meu conhecimento.

No dia 15 de março fui acordado ao som de motosserras que cortavam a mata ciliar do Rio Marimbondo, nas proximidades do acesso a Vila de Visconde de Mauá e diretamente sobre atrativo natural freqüentado por mim há 25 anos, a Usininha. Notifiquei a Coordenação de Fiscalização do PARNA de Itatiaia na parte da manhã e ao fim da tarde fui informado que deveria dirigir minha denuncia ao Órgão Ambiental Estadual responsável pelo licenciamento, com efeito, no dia seguinte registrei denuncia junto ao INEA, nunca obtive uma resposta.

Insatisfeito com a omissão desses órgãos busquei informações junto ao Conselho Gestor da Microbacia do Alto Rio Preto, instância responsável pelo acompanhamento das obras e que reúne representantes dos governos das diferentes esferas (União, Estados e municípios), associações de comerciantes locais e sociedade civil organizada.

Meu primeiro contato com o Conselho Gestor foi traumatizante, participei de uma reunião oficial que na verdade se transformou em duas representando a divisão da comunidade. Presenciei a confissão do Sr. Lauro Caldeira, proprietário do Hotel Tijupá e membro da diretoria de uma importante associação comercial, na qual responsabilizava representantes do governo do Estado do Rio de Janeiro por liderarem o desmonte dessa instância, juntamente com a prefeitura de Resende e outros representantes de associações comerciais locais.

Por orientação e com o apoio de associação comunitária  local encaminhei minha denuncia a APA da Mantiqueira que após apuração dos fatos conclui que os procedimentos previstos no licenciamento ambiental da referida obra não vem sendo cumpridos desde o inicio do projeto e que o Rio Marimbondo acumula multas que superam 1 milhão de reais. A referida intervenção em Área de Preservação Permanente aparentemente foi embargada, pois está abandonada por 3 semanas, com muito lixo e detritos sendo carreados para o curso d´água.

 Acabo de retornar do local onde ocorreu o novo deslizamento, mais um incidente previsível, sobretudo quando imaginamos que durante semanas essa enorme encosta tem sido abalada pelo uso de explosivos. Encontrei cavaletes e uma placa de interdição, mas nenhuma pessoa para fornecer esclarecimentos, cruzei a barreira e sem qualquer intervenção cheguei de carro ao local do acidente.  Ainda não obtivemos comunicado oficial, mas sabe-se que o desabamento de enormes blocos de rocha sobre a estrada ocorreu com o tráfego liberado, expondo todos a sério risco.

Na minha opinião, a comunidade tem sido vítima do desmonte intencional do Conselho Gestor que privado pelo poder público do acesso a informação não cumpre condicionante basilar no processo de licenciamento ambiental, o acompanhamento da execução das obras, enfim a participação social não existe.

O direito ao acesso a informação pública nos é garantido pela Constituição Federal de 1988 no caso do meio ambiente é reforçado pela Lei Federal 10.650 de 2003, figurando como principio básico de inúmeras convenções internacionais, incluindo aquelas decorrentes da Rio-92, famosa reunião global que popularizou o conceito do desenvolvimento sustentável.

Não sabemos quais surpresas ainda estão guardadas nas encostas da Serra da Mantiqueira, qual risco corremos ao circular pela Estrada Parque, não sabemos qual o passivo ambiental real em toda sua extensão, como será compensado ou mitigado.

Um Plano Básico Ambiental composto por 22 programas não saiu do papel mesmo após a prorrogação do contrato que acumula seis meses em atrasos, aditivos e obras emergenciais que praticamente dobram o orçamento inicial da obra.

O maior investimento per capta do Estado do Rio de Janeiro, o ícone do desenvolvimento sustentável estadual, aparentemente vai se tornar mais um “Elefante Branco” a ilustrar a longa lista de obras Brasileiras faraônicas embargadas por irregularidades e que somam atualmente mais de 20 bilhões em prejuízos aos cofres públicos.

Seguem algumas fotos do local do incidente.

Cordialmente.

André Pol