Desejamos uma gestão exemplar do nosso lixo
Será pedir demais?

Por Joaquim Moura

Todos que me conhecem e o meu trabalho sabem da importância que dou à gestão do lixo de nossa comunidade, trabalho para o qual venho convidando vocês todos há tanto tempo... Qual não foi então a minha surpresa ao saber que está sendo “desenvolvida” na região uma iniciativa do INEA, nesse sentido, sem que fôssemos convidados a ajudar em sua elaboração...

Breve histórico de meus esforços

Lembro-me de que a primeiríssima reunião de que participei na região, ocorrida no Museu Bühler, em 2002, logo após ter-me mudado para cá, foi sobre esse mesmo assunto, tendo então preparado uma proposta de projeto encaminhada à Mauatur, via Luis Alves, cuja resposta aguardo até hoje... Na época fiquei surpreso com a ausência de resposta, pois ainda não sabia que, por aqui, o ritmo é esse mesmo...

Depois, quando da definição das "diretrizes" do Conselho Gestor, sugeri que o desafio do lixo, de tão complexo, fosse deixado para ser discutido em um seminário organizado especificamente para o tema. A proposta foi aprovada, porém, poucos meses depois, fui surpreendido pela notícia de que o seminário iria mesmo ocorrer, mas tinha sido planejado sem a minha participação - logo eu, que dera a ideia... Também fiquei surpreso, pois ainda não conhecia o “padrão ético” que rege as relações nesta região...

Naquela ocasião, pediram-me apenas para redigir a carta-convite, criar o cartaz-convite, e desenhar o modelo das faixas-convite para o seminário... Para “variar”, percebi que haviam deturpado minha ideia, transformando o evento em mero palanque para figurões da política local e medalhões de “academias” distantes, sem maior compromisso com soluções objetivas para os nossos problemas imediatos, relacionados com o manejo do lixo local. Durante vários dias (4 ou 5, não lembro bem), em vez de discutirmos soluções práticas, fomos obrigados a escutar várias "palestras", só nos restando os 30 minutos no final do último dia (dos 4 ou 5 que durou o seminário), para um "brainstorming" onde fomos proibidos (Regina Guerra e eu) - por nosso amigo Sergio Maia - de pôr em pauta a questão da reciclagem dos resíduos orgânicos por compostagem (minha maior preocupação, como ambientalista que sou). Moral da história, o seminário virou um factóide sem qualquer impacto no encaminhamento do problema, que permaneceu igualzinho – apenas agravado pelo aumento da população fixa e flutuante desde então. (Apenas recentemente foi introduzido um caminhaozinho que recolhe, às 4as-feiras, uma pequena parcela do lixo seco reciclável na porção resendense do nosso vale, mas que mal altera a situação do caminhão que leva o lixo misturado, duas vezes por semana, para o Lixão em Bulhões, Resende).

Foi frustrante ver uma boa ideia – que reuniu cerca de 40 pessoas por 4 ou 5 dias – ser transformada em um factóide inconsequente. Aliás, as pessoas que prestigiaram o evento até hoje esperam pelo resultado, por uma avaliação, e pelos planos sobre o que seria feito a seguir... Mesmo por que nada foi feito...

Em 2007, já na “gestão Cabral-Pezão-Minc”, como marco inaugural do contexto mistificador da prometida “estrada-parque” - e como um aperitivo para as barbaridades que se seguiriam - recebemos uma pequena equipe da SEA para nos “ajudar” a desenvolver um projeto de “gestão integrada dos resíduos sólidos” da região. É claro que a tal equipe chegou com um modelo pronto, padrão, convencional, insuficiente e divorciado da nossa realidade. Basta lembrar que o primeiro orçamento montava a R$ 1.300.000,00 (um milhão e trezentos mil reais, isso em 2007)... Depois de várias reuniões, um projeto mambembérrimo, e ultimado literalmente sobre as coxas dos então líderes do Conselho Gestor, foi encaminhado em dezembro de 2008 (no apagar das luzes da gestão Silvinho Carvalho), com um orçamento bem mais modesto (R$ 70.000,00), mas tão medíocre que até hoje nem obteve resposta do governo estadual nem do FECAM (Fundo Estadual do Ambiente). Ver o projeto do CG-INEA aqui: Projeto do CG com assessoria do INEA. E veja também o Projeto alternativo aproveitando recursos locais e ainda a comparação TEAS dos dois projetos aqui: Quadro comparativo dos 2 projetos acima

Situação atual

Há dois anos, já diante dos efeitos socioambientais da facilitação do acesso à região, venho propondo um trabalho de educação ambiental comunitária com três eixos indispensáveis, e todos sabem que um deles é um “projeto exemplar-modelo de gestão do lixo à altura dos ambientalistas que vivem na região”. (Os outros dois eixos são "um foco nos estudantes do CEAQ" e "um esforço de educomunicação comunitária"). Veja as justificativas para esses três eixos aqui: Três eixos indispensáveis:

Pois bem: agora fui informado de que novamente uma equipe da SEA (ou, mais propriamente, do INEA) está desenvolvendo atividades em dois desses eixos: (1) ações de Educação Ambiental junto aos jovens do CEAQ e (2)  iniciativas ligadas à gestão do lixo local. Veja aqui a Proposta de ação com a juventude do CEAQ (março/2009).

Sem querer duvidar da boa-fé e da proficiência dos jovens contratados pelo governo para executá-los, temo que novamente resultem em factóides insuficientes diante da gravidade e complexidade dos desafios que enfrentamos. Aliás, as ações do governo estadual na região, nesses últimos anos, nos dá todo o direito de duvidarmos de sua competência, ainda mais sem a colaboração dos moradores mais experientes. O que temos visto são ações mais voltadas para atender a sua agenda política, que não nos interessa, e divorciadas da nossa realidade e reais necessidades. Mais uma vez, como ocorreu recentemente com o “seminário sobre impactos” e o “concurso de redações no CEAQ”, nossas ideias são confiscadas e adulteradas, transformadas em qualquer bobagem só “para inglês ver”, ou só para “mostrar serviço”... Todas essas ações só teriam alguma chance de dar certo se fossem implementadas de modo integrado, sistêmico, holístico, mas temo que esses sejam conceitos complexos demais para os nossos jovens "educadores ambientais", que acreditam que basta a sua vontade e o seu mandato para serem bem sucedidos onde pessoas muito mais experientes penam para avançar em meio à ignorância e à alienação - não só da população mas também, e principalmente, das autoridades e dos gestores públicos, como estamos vendo ocorrer nas RJ-163 e 151, também na Via Dutra, onde um arvoricídio holocáustico está sendo perpetrado.

Paralelamente, a UERJ e a Seobras também implementam seu programa de Educação Ambiental, conforme exigido no PBA, sem qualquer participação dos moradores em seu planejamento, mesmo que entre nós haja pessoas que já trabalham pioneiramente com esta questão há mais de três décadas... Preferiram contratar uma professora que mais estrangeira à nossa realidade não poderia ser, que realizou algumas oficinas onde muito se choveu no molhado e depois desapareceu. Talvez ainda ressurja qualquer dia desses, com mais ideias exóticas, importadas não se sabe de onde. Especula-se que da Argentina, ou do México, ou até de Cuba, nunca se sabe...

Conclusão

Realmente, é até patético ver um amigo nosso coonestando tais irresponsabilidades e prestigiando tamanha malversação de recursos públicos – que deveriam estar sendo aplicados de modo muito mais judicioso e consequente, pensando-se primeiramente no futuro da região e de seus moradores, e não nos interesses de seu empregador. Aliás, o que impede que esses servidores - improvisados em "gestores ambientais" - se disponham a nos convidar – a todos nós interessados – para contribuirmos para planejar o melhor projeto de EA possível, à altura de nossas necessidades, da nossa experiência e da importância histórica e emblemática da região de Visconde de Mauá no cenário ambiental brasileiro?