Como enfraquecer a comunidade diante de um desafio formidável

Por Joaquim Moura

é preciso ser muito irresponsável para não perceber o que nos espera nas próximas décadas, em face da crise global e dos desafios locais - entre os quais a facilitação do acesso é apenas um deles, mas o principal... Então, e sendo assim, deveríamos reunir nossos melhores recursos humanos para ajudar a organizar a comunidade no enfrentamento dos impactos negativos e no aproveitamento das oportunidades criadas com a pavimentação do acesso. Mas não é o que se vê...

Como é natural, existem divergências com relação ao modo como as obras estão sendo executadas, e muitos moradores estão incomodados a ponto de recorrerem à Justiça, onde tiveram suas demandas acolhidas pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual (RJ). Estão exercendo seus direitos e - a seu ver - cumprindo uma obrigação, ao exigirem o cumprimento da legislação ambiental brasileira. Afinal, o futuro socioeconômico desta região depende totalmente da preservação ambiental.

De fato, essas ações dos moradores inconformados com as imperícias e imprudências cometidas (conforme laudos do ICMBio) têm sido valiosas para que o governo, sentindo-se fiscalizado, se acautele mais nas obras na RJ-151, e seja levado a repensar detalhes e procedimentos para reduzir impactos, poupar árvores e encostas e evitar desfigurar ainda mais a paisagem.

No entanto, qualquer morador que seja identificado como crítico dos aspectos criticáveis do empreendimento é hostilizado por lideranças das associações locais (interessadas no asfaltamento já, a qualquer custo) e apontado à execração pública como "inimigo da população", por frustrar as expectativas de emprego farto e renda abundante para todos graças aos magotes de turistas cheios da grana que as estradas pavimentadas nos trarão para sempre.

Como exemplos do ponto a que está chegando a desorientação, o sectarismo e a inconsequência da "facção pró-asfalto-já-a-todo-custo", gostaria de registrar (além do constrangimento e desrespeito sofridos pelo biólogo André Pol -veja o vídeo) três fatos recentes que evidenciam esse esforço para dividir a comunidade em dois grupos: (1) de um lado, os do bem, os empresários aliados do governo e da população local (mauaense quatrocentões); e (2) do outro, os do mal , os "ambientalistas": gestores e educadores ambientais, professores, biólogos, geógrafos, engenheiros, arquitetos, veterinárias, agrônomos, comunicadores e artistas que aqui vivem, acusados de forasteiros e inimigos dos comerciantes e do povo em geral. Apostar em isolar quem pensa com profundidade e prudência sobre os nossos desafios - que exigem mais união do que nunca - é mais do que mera insensatez... é um crime contra o futuro!

  1. Impresso distribuído durante a madrugada, atacando dois moradores especialmente ativos em seu inconformismo, mas nem por isso merecem ser expostos à agressividade de moradores frustrados por vários motivos. E mais grave ainda por que seus autores não se identificam - embora tenham identificado com nome, sobrenome e foto as suas duas vítimas. Obs.: para não colaborar com os detratores anônimos, não reproduziremos o impresso; pois só publicamos textos assinados ou de origem conhecida. Ao lado reproduzimos apenas a nota que ele gerou no jornal Beira-Rio n# 769 (10-16/08/2012) para que o fato fique registrado para sempre.
  2. Cancelamento das apresentações de técnicos e gestores do INEA sobre questões do maior interesse para a comunidade - relacionadas, por exemplo, com as especificidades de se viver em uma área de proteção ambiental, e com a criação do Parque Estadual da Pedra Selada e suas repercussões, positivas e negativas, para quem vive e produz em sua área e entorno. A primeira apresentação foi cancelada na véspera por pressão de grupos que não admitem que se discutam assuntos sobre os quais já têm opinião formada - formada segundo seus interesses.
  3. Mensagem (abaixo) de uma moradora atacando quem se preocupa com os aspectos socioambientais que precisam ser discutidos, analisados e bem encaminhados; ao invés de serem negligenciados - como que ela defende em sua política de rumo ao progresso sem maiores preocupações ... Seus termos foram tão destemperados que o ambientalista integral Lino Matheus achou indispensável registrar o nível dos argumentos assacados pela moradora, apoiados, segundo ela, por mais de 80 outros moradores... Isso numa região que depende 100% da preservação ambiental para poder sonhar em um futuro risonho e sustentável. Não dá para entender...


    Marlene Edna Lanfredi (25 de junho)

    Dá PRA ENTENDER?! *

    Penso que você está completamente equivocado. Você e mais as outro dezoito pessoas que querem acabar com uma prerrogativa garantida em nossa constituição: o direito de ir e vir.

    Aqui não temos desmatadores, não temos plantadores de soja nem assassinos de sem terra que ocupam as terras improdutivas. Portanto nem uma tragédia assola nossa terra. Por que vociferar tanto por um bem necessário e desejado pelos moradores, habitantes de nossa região?

    Já desci com minha mãe debilitada por Alzheimer e Parkinson, porque fraturou uma perna num tombo, que chegou lá no Samer toda vomitada e desidratada, meu sobrinho perdeu um dos dedos das mãos por não conseguirmos chegar a tempo no hospital e outros incidentes e acidentes ocorridos (comigo e com terceiros) que se estenderiam por diversas páginas em sua descrição.

    O acesso é necessário para o bem estar e melhor qualidade de vida de seus moradores: acesso aos centros maiores para cuidar da saúde,da educação, para recebermos serviços necessários aqui no alto (máquinas e equipamentos), para economia de recursos, para melhor atendimento na área de comunicação, enfim não podemos e não queremos ficar isolados olhando pássaros e borboletas, recebendo dinheiro de parentes ou de aposentadorias ou ainda de bolsas de estudo para defender teses para adquirir grau de doutor.

    Nós que aqui estamos há mais de trinta anos e que ajudamos a reflorestar a região, construímos com sacrifício nossos pequenos negócios que garantem apenas uma vida simples. Mesmo os ditos empresários, não usufruem de fortunas (muitos estão endividados por investir na região) nem são poderosos a ponto de comprar autoridades para garantir benefícios próprios.

    Somos todos moradores que adoramos Mauá e queremos preservá-lo. Sempre fomos amigos de nossos vizinhos (artistas, pequenos empresários, pequenos comerciantes e trabalhadores em geral) e agora surge meia dúzia de pessoas (aliás são dezenove) se dizendo ambientalistas gerando conflitos, disseminando maledicências, criando antagonismos, onde sempre existiu cordialidade, amizade e companheirismo.

    Vocês que vociferam, babando de raiva como cães raivosos que chegaram muito depois de nós, que estão ocupando também espaço do verde (ou acham que suas casas são invisíveis para os animais e plantas?), não conhecem os moradores, não são nossos amigos.

    Se dizem amigos de Mauá, mas não são amigos das pessoas que aqui moram. São amigos de algo abstrato que só existe no cérebro miúdo de radicais nocivos que discriminam o social, as necessidades humanas.

    Queremos acesso limpo, bem feito, de qualidade. Chega de estradas esburacadas, sem corte para as águas, sem condições de tráfego..

    Visconde de Mauá é Flora, Fauna, Paisagem e Gente!
    Dá para entender?

    Lino Matheus de Sá Pereira (15 de julho)

    NãO DEU PRá ENTENDER NãO...! --( * )

    Lastimo ter que responder e refutar argumentações tão descabidas e inconsideradas, tão longe do terrenos das ideias e do bom convívio, partindo de pessoa que considero amiga. Escrevo, entretanto, não só na qualidade de antigo morador da região, da década de 70, quanto na de ambientalista, um dos citados 19 inimigos públicos... Mas me manifesto, sobretudo, na condição de reconhecido estudioso das questões sócio-ambientais da Mantiqueira.
    Diante de argumentação tão eivada de sofismas e ululante, a ponto de resumir-se em um mero exercício de agressividade verbal, fica-se perguntando que motivação teria levado à um ataque tão grosseiro à concidadãos idôneos, pais de família, pessoas culturalmente preparadas e tecnicamente abalizadas e com elevado grau de consciência civil, que não se omitiram ou intimidaram em defender suas convicções? Como é possível, defendendo posições partilhadas por alguns tantos elementos envolvidos, de questionável integridade ou motivação, tentar desqualificar assim pessoas, membros da mesma comunidade, que assumem legítimas preocupações com o futuro da região, chamando-as de cães raivosos...!? Serei eu, um senhor de 70 anos, cidadão respeitado, que luta há anos para preservar o patrimônio natural, paisagístico e cultural da região (defendendo exatamente o cabedal que sustenta as atividades da comunidade) um cão raivoso e babando ?? Algum comerciante que frequento para fazer minhas compras, me vê assim ? Fica a pergunta : em que, esse repetido comportamento, sempre hostil e agressivo, que insufla e instiga, maliciosamente, a opinião pública contra pessoas que têm direitos legítimos de se manifestar e atuar, poderá ajudar a criar um clima de maior tolerância e entendimento ? Que interesses imediatistas ou escusos se escondem atrás de toda essa armação ? Quanto acovardamento diante da ganância dos poderosos , estes sim, que foram arribando aqui, para impor seus jogos de interesses exclusivamente financeiros, tentando transformar a Mantiqueira em mercadoria... Estes, com certeza, não vieram para cá para, como diz, perder seu tempo olhando pássaros e borboletas ... muito menos contemplar estrelas ou plantar árvores, acrescento eu, que luto há anos e arrisquei a pele para fechar serrarias e que plantei, com minhas mãos, mais de 20.000 árvores, 2.000 araucárias ...
    E o que pode significar essa pseudo maioria de 100% ( ! ) senão desinformação, manipulação, passividade ? e como dizia o grande Nelson Rodrigues : toda a unanimidade é burra... O MP e o Dr. Juiz que embargou a obra por descumprimentos da lei, parece que não ligaram muito para essa maioria... Se valessem estatísticas, porque não citar as mais de 1.500 assinaturas de frequentadores da região, em abaixo- assinado ( enviado para o MP há tempos ) que preferiam que as estradas fossem preservadas, com procedimentos e pavimentação mais adequados à uma região de vocação para um turismo ecológico e não de massa.
    Argumentações falsas e enganosas... Não foi cumprido o acordo consensual da verdadeira estrada- parque... ( que, por padrões ambientais rigorosos, custaria um quinto ( 1/5 ) do que se gastou até agora , R$ 70.000.000,00 !! ) e ainda vai se gastar muito mais ... para os bons negócios das empreiteiras e dos políticos..... Com esse dinheiro despendido a mais ( veja a lista das benfeitorias possíveis no site Amigos de Mauá, por exemplo ) teríamos, não só aqui mesmo, à nossa porta , um bom HOSPITAL, como poderiam ser atendidas quase todas as demandas da população : creches, escolas melhoradas, escola técnica, saneamento, tratamento urbanístico, calçamento de ruas, planejamento urbano, transporte interno, assistência social, museu, etc., etc. Estão se aproximando e se instalando graves crises ambientais e geopolíticas e a população precisa ser informada, preparada. Também precisa abrir os olhos e ser esclarecida, orientada e não se deixar manipular por agentes de interesses alheios, estes sim, que andam circulando e semeando mentiras e discórdia...
    LINO MATHEUS DE Sá PEREIRA (um dos 19)
    (Filósofo, ambientalista, produtor rural, hoteleiro)

    Este texto iniciava com o parágrafo abaixo ao ser originalmente enviado ao jornal à "Montanha" (que publicara o texto à esquerda):

    Até o momento ainda acreditava ser possível para uma pequena publicação zelar por seu critério de isenção jornalística... Mas não notou o editor que, ao lado do seu edital - em que faz uma ginástica verbal ao estilo nem contra, nem a favor, muito pelo contrário..., tentando clamar por conciliações e equilíbrio de opiniões - publicou, exatamente, matéria provocativa e ofensiva, muito além do que seria cabível, contrariando frontalmente as suas palavras?

    Ao ter sua resposta publicada na edição seguinte da Montanha, Lino inseriu este parágrafo inicial:

    Agradeço ao Toninho Guia por abrir espaço para que exercêssemos nosso direito de resposta em relação ao texto insultuoso, agressivo e incoerente, aqui publicado, assinado por Marlene Lanfredi.